O DIA MUNDIAL SEM CARRO NA CIDADE MARAVILHOSA

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Aparecida en la revista Piel de Leopardo, integrada a este portal.

Mais um ano e nada acontece no Rio de Janeiro para melhorar a qualidade de vida, que, como muitas cidades pelo mundo, vive para os carros e não para as pessoas. A diferença está em que nas outras capitais existem grupos de pressão que exigem dos governos novas atitudes.
O dia mundial sem carro é sempre no dia 22 de setembro, nasceu em Paris e a cada ano há mais cidades aderindo ao movimento.

Em algumas existe o apoio das prefeituras, mas em outras os próprios habitantes tomam a iniciativa. Quem participa deve deixar seu carro em casa e procurar outro transporte na tentativa de melhorar sua qualidade de vida. Os mais engajados não têm automóvel, mesmo tendo dinheiro. É uma ação política que acontece em mais de mil e quinhentas cidades pelo mundo que buscam novas alternativas para seus problemas de transporte. Trata-se de uma data de conscientização ideológica e prática, tanto para os governos como para as pessoas de um modo geral.

Devem existir muitos motivos pelos quais as pessoas e o governo do Rio de Janeiro não tomam conhecimento ou não fazem questão de participar desta importante data. Arrisco que existe no carioca, por trás de sua auto-imagem de povo amigo, um individualismo crônico que detesta política e coletividade. Aqui a maioria quer ser bacana e ninguém quer passar por pobre. O carro é muito mais do que um transporte: é uma distinção social pela qual muitos consumidores gastam grande parte de seus salários e de suas vidas comprando, mantendo e renovando suas máquinas.

As pessoas estão dominadas

Em qualquer parte do mundo é desse jeito, as pessoas estão dominadas pela indústria do automóvel e não enxergam e nem querem saber de outras possibilidades, mas isso não é igual nem eterno em todos os cantos do planeta.

Em alguns dos países mais ricos do mundo o carro perde espaço nas cidades, como na Alemanha, por exemplo, onde aproximadamente 27% da população vive sem carro e vai de bicicleta ao trabalho porque, simplesmente, gosta desse transporte. Claro que lá o contexto urbano é diferente, mas também é a mentalidade ecológica dos alemães, entre outros fatores, que faz acontecer essa melhor qualidade de vida, que não nasce de um dia para o outro nem chega pela graça de Deus ou das autoridades.

Aqui a mentalidade é outra e de fácil resposta: como a cidade do Rio de Janeiro poderia participar do Dia mundial sem carro se a pessoa que anda no transporte público fica louca para ter um carro e aquela que anda fechada na sua carroceria vive a máquina como se fosse seu próprio corpo?

A ideologia das quatro rodas está tão incorporada na sociedade brasileira que ninguém questiona nada de fundo. Por exemplo, fala-se muito da imprudência no trânsito, mas não da potência dos carros que saem das fábricas prontos para atingir velocidades assassinas proibidas na lei. De fato, vede-se carros que prometem 250 km/h para o usuário, quando, na verdade, a velocidade máxima, nas melhores estradas do país, não pode ir além de 110km/h. Estimula-se a cada instante na televisão o consumo dessa vertigem adolescente que, como as drogas, mata e é ilegal.

Quem não perdeu um parente no trânsito ou perde horas nos engarrafamentos? Quem não pensa que seria belo viver sem o barulho dos motores? Mas isso, no individualismo carioca, não interessa de verdade, o importante é ter carro próprio e mais espaço nas ruas, assim como vagas de graça nos shopping.

Realmente, o que os motoristas do Rio de Janeiro esperam das autoridades é que melhorem o asfalto das ruas, façam mais viadutos, transformem as calçadas em estacionamentos e, entre outras medidas, acabem com os flanelinhas, os ladrões e as crianças nos sinais. A indústria do automóvel pensa pela pessoa e afirma por ela, que o mais importante na cidade é facilitar a existência do motorista, pois, para ela, a qualidade de vida é quantidade de carros.

fotoSó resta lamentar

Só resta lamentar que o Rio de Janeiro seja mais uma grande garagem sem vaga para todos seus veículos. Aqui, como em qualquer mega-cidade, deveria haver no mínimo quinze linhas de metrô e outras dez de trens para poder sair e voltar da cidade sem maiores transtornos, além de vias especiais para ônibus ecológicos e outras para bondes modernos; todos esses meios interligados sem saturar o sistema, possibilitando o conforto e a rapidez no transporte.

Para que a cidade seja realmente maravilhosa deveria ser para as pessoas, com largas e exclusivas calçadas para pedestres, com ciclovias e áreas verdes para desfrutar do seu clima e da sua paisagem no dia a dia. Como em qualquer cidade que realmente aprecie seus habitantes o Rio de Janeiro deveria ter muito mais moradias, hospitais e escolas do que vagas para carros. Contudo, seria ridículo afirmar que todos os problemas da cidade sejam por causa desse objeto de desejo, mas, com certeza, diminuindo sua presença nas ruas e nas mentalidades poderiam se desenvolver outros projetos mais interessantes.

Tudo isso é utopia (ou um papo muito chato) que ninguém acredita que seja nem um pouquinho viável: uma perda de tempo da minha parte e dos leitores que sonham com uma cidade inteligente. Assim sendo, o presente é sombrio e o futuro patético, pois sem uma renovação do pensamento e das políticas públicas, que se preocupem mais no coletivo do que no consumidor automobilístico, a cidade será cada vez mais intransitável, além de violenta.

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* Professor universitário e ciclista amador.
Correo electrónico: godoyfajardo@yahoo.com.br

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