Razões para Lula assumir o governo

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A radicalização política atingiu níveis explosivos, e se situa no plano da histeria e do confronto irracional. Ela coincide e é retroalimentada por uma brutal crise econômica.

Neste ambiente de radicalização política combinada com crise econômica, se afiguram inequívocas as incapacidades e os limites do governo Dilma em oferecer as respostas exigidas pelas circunstâncias.

Todos os atores diretamente implicados no xadrez político trabalham com distintos cenários para a superação da crise. Todavia, em todos os cenários projetados, a Presidente Dilma figura marginalmente na equação, e não centralmente.

Este não é um tempo de normalidade. É um tempo singular, especial, que condensa os acontecimentos complexos originados na guerra contra os avanços democrático-populares aberta ainda na segunda metade do primeiro mandato da Presidente Dilma [as tais jornadas de 2013 se situam ali], quando os efeitos da crise capitalista mundial agudizaram o conflito distributivo no Brasil e decretaram o fim do modelo “ganha-ganha” e de conciliação de classes, em que os ricos ficam mais ricos e os pobres menos pobres.

Esta guerra ganhou contornos beligerantes a partir de 26 de outubro de 2014, com a recusa intransigente dos derrotados na eleição presidencial aceitarem o resultado das urnas. Para conservar seus privilégios e poderes, a classe dominante se insurge com extraordinária violência e vilania.

O reacionarismo – espectro ideológico liderado pelo PSDB e integrado por políticos e partidos conservadores, ONGs e movimentos suspeitos financiados pelo grande capital, mídia oposicionista, setores do Judiciário, da Polícia Federal e Ministério Público – desfechou uma campanha sistemática e inteligentemente coordenada de ataque ao Estado de Direito, de regressão jurídica e democrática e de desestabilização política e econômica do país.

Este momento de histeria e reacionarismo febril da classe dominante só encontra equivalência histórica nos momentos mais turbulentos da vida nacional: no período de 1950/1954, que culminou no suicídio do Presidente Vargas; e no período de 1960 a 1964, que abrange a campanha pela Legalidade liderada pelo Brizola em 1961 e que culmina no golpe civil-militar que depôs Jango em 1964.

É obrigatório reconhecer que a oposição conseguiu gerar os impasses atuais devido, em boa dose, a equívocos primários do governo. Por isso o governo – e, é importante admitir-se, a pessoa da Presidente – infelizmente é percebida mais como parte da crise do que solução.

A conjuntura adquiriu velocidade supersônica a partir da arbitrariedade da Operação Lava Jato contra o ex-presidente Lula, no dia 4 de março. Com as manifestações deste 13 de março, o golpismo deverá subir de patamar.

A classe dominante não conseguiu desferir o golpe derradeiro em razão de pelo menos dois fatores: [i] a imponderabilidade em relação aos traumas, conflitos e violência que a quebra da ordem democrática poderá desatar; e [ii] porque ainda não encontrou uma alternativa, no seu seio, que ofereça confiabilidade do trânsito para o novo regime político e [principalmente] econômico que enterre o ciclo lulo-petista iniciado em 2003.

Como dito antes, este não é um tempo de normalidade, é um tempo singular, especial; de guerra da direita para destruir uma perspectiva democrático-popular de país. E tampouco é um tempo de previsibilidade; as coisas podem acontecer sem obediência à lógica mais elementar.

Esta é uma conjuntura que admite medidas por assim dizer “atípicas”, como, por exemplo, a nomeação de Lula para o ministério do governo Dilma. Em “tempos normais”, dificilmente se cogitaria uma hipótese dessas.

A história é feita dos personagens e suas circunstâncias. Nesta circunstância histórica, Dilma faria um gesto de enorme transcendência consignando a Lula a condução do governo.

A alegação oposicionista de que o ministério seria um refúgio judicial para o ex-presidente porque o cargo tem foro privilegiado, é uma leviandade que desaparece do noticiário no primeiro dia de trabalho dele percorrendo o país. A direita tenta impugnar a ida dele para o governo porque quer esterilizá-lo, e assim afastá-lo da arena fervilhante da luta de classes.

A questão fundamental, portanto, é outra; é saber se esta é, de fato, a única possibilidade para reverter o quadro dramático e; além disso, saber se na presente conjuntura existe alternativa capaz de mudar o desenrolar dos acontecimentos.

Neste momento, o campo democrático-popular está desafiado a resistir e a reverter a tendência de derrota – que, se consumada, representará uma derrota cultural de longo prazo não somente do PT, mas do conjunto da esquerda brasileira e latino-americana.

Lula poderia assumir qualquer posto ministerial, porque sua simples presença no governo interromperia a ofensiva inercial da direita e inauguraria uma nova etapa política e uma nova condução econômica, nas bases propostas pelo Diretório Nacional do PT.

Com sua autoridade moral e força política, Lula poderá ser um fator novo, capaz de deter o golpismo e recompor a capacidade de iniciativa do campo democrático-popular. Se ainda tiver tempo para isso.

Se existirem outras possibilidades, mais eficazes, que sejam empreendidas, e com urgência.

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