Galeano e o silêncio das palavras

1.749

As palavras hoje calaram; elas entristeceram. Não podem ser esculpidas da voz, porque hoje a voz não sai: é difícil e doloroso dizer adeus a Galeano. As palavras faziam parte dos ritos solenes e sagrados de Eduardo Galeano. Ele as empregava com a parcimônia típica dos colibris que, com beleza e leveza, flanam diante das flores enquanto colhem seus néctares.

A solenidade e a sacralidade com que brincava com as palavras conferiam veracidade indestrutível à denúncia que fazia dos paradoxos duma América Latina rica, porém espoliada pelos poderosos nativos e estrangeiros.

Com palavras certeiras, exprimia uma consciência implacável em favor dos povos ultrajados pelas elites egoístas; com elas levantou-se insurgente contra todas as formas de opressão.

Galeano lapidou palavras que nos ajudaram a conhecer e a interpretar o mundo. Ele não arriscava improvisos para traduzir o sentido das suas palavras; preferia lê-las e interpretá-las em cerimônias de impressionante reverência às suas plateias.

As palavras hoje calaram; elas entristeceram. Não podem ser esculpidas da voz, porque hoje a voz compreensivelmente não sai: é difícil e doloroso dizer adeus a Galeano.

As palavras não se deixam escrever porque não encontram, dentre todos os idiomas da terra, aquelas capazes de homenagear este que é o mais inigualável subversivo; um ser humano original e inconcedível na luta contra a opressão, a desigualdade, a injustiça, o preconceito.

Que privilégio pertencer a esse mesmo mundo palmilhado por Galeano, espelho duma nova e cada vez mais imprescindível humanidade. Sempre acompanhado da esperança, ele ensinou a crer que “o mundo que necessitamos não é menos real que o mundo que conhecemos e padecemos”.

También podría gustarte
Deja una respuesta

Su dirección de correo electrónico no será publicada.


El periodo de verificación de reCAPTCHA ha caducado. Por favor, recarga la página.

Este sitio usa Akismet para reducir el spam. Aprende cómo se procesan los datos de tus comentarios.