
Negri é co-autor, com Michael Hardt, do livro "Império", publicado no Brasil em 2001 e umas das obras mais importantes e polêmicas sobre o processo de globalização. Com Giuseppe Cocco, publicou "Global – Biopoder e Luta em uma América Latina Globalizada", em 2005. Leia a entrevista completa, concedida por Negri via telefone desde Veneza.
AN – A posição italiana é uma posição muito complexa. Com se sabe, o governo italiano é um governo de direita e é um governo que, depois de 30 anos, retomou a perseguição das pessoas que se refugiaram no exterior depois o final dos anos 70, depois do final dos anos nos quais na Itália houve um forte movimento de transformação, de rebelião. E portanto o governo italiano retoma hoje uma campanha pela recuperação destas pessoas. Em particular, tentou fazê-lo com a França, para conseguir a extradição de Marina Petrella [condenada por subversão pela justiça italiana] e não conseguiu porque o governo francês, a presidência francesa [Nicolas Sarkozy], impediu. Neste ponto, aparece em um momento exemplar o caso Battisti.
–O que o senhor quer dizer com perseguição? É perigoso neste momento para Battisti retornar à Itália?
AN – Eu não sei se é perigoso. Mas é certo que ele foi condenado à prisão perpétua e seria para ele uma situação muito grave. Mas seguramente ele seria alvo de uma perseguição política e midiática.
– Trata-se, portanto, de um temor com fundamento?
AN – Veja bem, o governo italiano, depois de 30 anos, quer recuperar, para fazer um exemplo, as pessoas que se refugiaram no exterior. E que se refugiaram no exterior porque na Itália havia uma condição de Justiça que era impossível de agüentar.
AN – Precisamente. Resolveria em dois sentidos: por um lado, se recupera aquilo que eles chamam ‘um assassino’; e por outro se esquece aquele que foi um Estado de Exceção, que permitiu a detenção e a prisão preventiva de milhares de pessoas durante estes anos. É necessário recordar que nos anos 70 o limite jurídico da prisão preventiva era fixado em 12 anos. É necessário recordar o uso da tortura e de processos sumários inteiramente construídos sob a palavra de presos aos quais era prometida a liberdade em troca de confissões. Este foi o clima dos anos 70. E não nos esqueçamos que nos anos 70 houve 36 mil detenções, seis mil pessoas foram condenadas e milhares se refugiaram no exterior. E se há quem duvide desses números, e que quer continuar duvidando, basta que deem uma olhada nos relatórios da Anistia Internacional naqueles anos.
– Se houvesse um governo de esquerda na Itália o caso seria o mesmo? [O líder da oposição de centro-esquerda] Romano Prodi faria o mesmo?
AN – Eu não acredito que Prodi faria o mesmo, mas parte da esquerda faria o mesmo, isso é verdade.
– Como o senhor vê hoje o PAC [Proletários Armados pelo Comunismo, grupo do qual Battisti fazia parte]?
AN – O PAC era um grupo muito marginal, mas isso não significa que não estivesse dentro do grande movimento pela autonomia. Mas ouça, o problema é esse: eu acho que as coisas das quais foi acusado Battisti são coisas muito graves, mas – e isso me parece importante dizer – estas são responsabilidades compartilhadas por toda a esquerda verdadeira. Não se trata de um caso específico. O Supremo Tribunal Federal do Brasil construiu uma jurisprudência pela qual foram acolhidos outros italianos nas mesmas condições que Battisti.
Antonio Negri, 75, é um filósofo italiano, professor da Universidade de Pádua (Itália) e do Colégio Internacional de Paris (França). Entre os anos 50 e 70, participou dos movimentos de esquerda na Itália, condenando tanto a direita quanto o stalinismo. Esteve preso entre 1979 e 1983, depois se exilou na França por 14 anos. Condenado por subversão, o filósofo voltou para a Itália em 1997 e cumpriu pena até 2003. Atualmente, divide seu tempo entre Veneza e Paris, cidades onde desenvolve atividades acadêmicas.
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