Um pequeno conto de natal, simples, bem brasileirinho

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… Recém » saído do forno», despretensioso, nem tão cristão e com final feliz. E não só o pequeno conto que eu conto,  que 2011 também, termine bem pra todo mundo. E  para o novo ano que se anuncia, que não haverá  de ser com o fim do mundo, como profetizaram,  quem sabe com o começo de um  mundo novo, melhor… bem melhor? |CARLOS GRASSIOLI.*

Porque se a esperança terá que morrer, que seja como o seguro, que morra de velha!
Um grande abraço à todos e sempre minha  gratidão aos que me lêem.

Que encanto o das imaginações da infância… Tudo vai e vem, em transformações deliciosas; olhamos tudo e vemos apenas como imagem momentânea da fantasia… E andamos meio cegos, olhando tanto para dentro como para fora, às vezes despejando na sombra da alma a carga de imagens da vida, ou abrindo ao sol, como flor verdadeira e colocando-a em fronteira real, a poesia, que depois nunca mais se encontra, da alma iluminada.
J.R. Jiménez – Platero e eu.

Era uma vezinha, duas menininhas. Toninha e Matilde moravam numa cidade ribeirinha, bem longe uma da outra, mas a maior distância entre elas acontecia em outro plano.

A mãe de Toninha entrava, diariamente, na casa de Matilde (um pequeno palacete), pela porta dos fundos. A mãe de Matilde… não tinha a menor idéia de onde morava a mãe de Toninha.

Essas diferenças separaram as duas meninas, até o dia em que, por força das circunstâncias, começaram a brincar juntas. Na casa de Matilde, é claro.
Tão logo ficaram sozinhas, descobriram um tipo de afinidade determinante e definitiva.

Eram duas sonhadoras natas!

Matilde, habituada a ter tudo o que queria, carecia de matéria prima para seus sonhos, ao contrário de Toninha que tendo quase nada além de bonequinhas de panos feitas pela mãe, tinha tudo e mais um pouco para almejar, para sonhar. Percebendo as diferenças de seus viveres, não se queixava, mas era eximia em usar a imaginação, como forma de compensar ou amenizar essas diferenças.

O ano chegava ao fim e a cidade toda… ou quase toda, estava decorada com luzinhas de natal.

O tempo privilegiou a data de 24 de dezembro, com uma belíssima noite de temperatura amena e todo mundo… ou quase todo mundo, foi dormir cedo, pra ver os presentes no outro dia, ao pé da árvore .

No dia 31 à noite, ao contrário, choveu cântaros, o rio subiu e alagou a cidade e todas as famílias… ou quase todas as famílias festejaram sem sair de casa.

Era, então, 02 de janeiro, logo após as festanças de fim de ano, quando tudo —ou quase tudo— voltou ao seu normal, inclusive as águas do rio… inclusive as diferenças.

Nesse dia Matilde, que ao contrário de Toninha, havia ganhado muitos presentes, com uma expressão de quem está sonhando acordada, perguntou à sua mãe porque é que eles moravam num palacete e não numa palafita. A mãe respondeu, laconicamente, que em palafitas moravam as pessoas pobres.

Então Toninha é pobre? É… e vamos mudar de assunto, respondeu rispidamente a mãe.

Mas Matilde não se deu por satisfeita e voltou a perguntar, qual era a maior diferença entre uma palafita e um palacete.

A diferença maior, minha filha, é que um palacete, como tua casa, por exemplo, fica bem firme no chão, e uma palafita é construída dentro da água e sobre estacas compridas, de madeira. Além do que, na tua casa não entra água nem pelo telhado, nem pelo chão e tem tudo o que uma família precisa pra viver muito bem. Tem luz elétrica, água encanada e todas essas coisa bonitas que tem aqui dentro e que você não vai ter dentro de uma palafita.

Grande África —disse Matilde, num muxoxo e emendou— … que graça tem, se palacete não tem pernas de pau?

Como assim?– perguntou a mãe.

Como a casa de Toninha que não só caminha como caminhou pela cidade toda, na noite de natal enquanto todo mundo dormia, menos ela e sua família, que das janelas, enquanto a casa caminhava, aproveitaram pra ver todas as casas decoradas com luzinhas que piscavam…

… E nem vira barco, quando dá enchente… e vai até a África como foi a família da Toninha, na noite de ano novo e só voltou porque o pai achou que já tinham ido longe demais, completou Matilde.

Quem foi longe demais, na verdade, foi Toninha que foi proibida de continuar a inventar esse tipo de coisas à Matilde.

Mas o que o palacete não sabia, é que na calada da noite, enquanto todo mundo… ou quase todo mundo dormia, a palafita , com suas pernas de pau, passava rente à janela do quarto de Matilde, que já estava à espera.

O movimento do caminhar da casa pernalta dava às duas meninas a nítida sensação que não era a casa e sim a cidade adormecida é que passava, em câmera lenta, pela janelinha do quarto de Toninha.

De fora, podia-se ver as duas carinhas, na janela, de olhos bem abertos, arregalados, que só fechavam, assustados, quando passavam por algum lobisomem.
Tinham combinado, inclusive, de que na próxima enchente, iriam dar a volta ao mundo… até o Japão.

Não só foram, como trouxeram duas bonequinhas de panos… de olhinhos puxados.

Tão lindas eram as duas bonecas! Tão felizes ficaram as duas meninas!

* Escritor.

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