Autores, naciones. – O IMAGINÁRIO SOCIAL BRASILEIRO NA OBRA DE LIMA BARRETO

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Aparecida en la revista Piel de Leopardo, integrada a este portal.

Quando falamos de imaginação, sempre nos centramos em figuras intangíveis e abstratas, que fora da realidade são poucas vezes consideradas na construção da representatividade social. O imaginário este elemento construtivo da identidade nacional, é hoje uma nova janela aberta nos estudos culturais em busca da compreensão da sensiblidade humana edificada na história de cada povo.

Desde essa perspectiva, e considerando o “imaginário” uma entidade latente, permanente e necessária na construção das metáforas de um povo, optamos por uma análises da obra de Lima Barreto que visa identificar aqueles mecanismos pessoais que foram simbólicamente usados pelo escritor em narrativas e discursos povoados de posturas ideológicas e raciais.

Lima Barreto, observador de sua época, e de seu povo, fez emergir da sua profunda solidão, elementos críticos e literários que através de sua narrativa, e da construção de suas personagens deram como resultado realidades que simbolizaram a vida cotidiana e sacrificada de uma grande parte do povo brasilero.

Sobrevivente de uma sociedade brasileira de divisões sociais indignas e preconceitos raciais medievais, foi sem dúvida, um valente e digno ser humano. Escreveu sobre filosofia, sobre história, admirou a poesia e se casou finalmente com o compromisso social. Um compromisso que nasceu da sua própria condição de brasileiro de segunda classe , de “mulato”, e de “inadaptado”, a um sistema de castas sociais, de castas burguesas, de guerras sem sentido que se não tivessem existido poderíamos ter tido a chance de conhecer um outro Brasil.

Este é o Brasil que vamos saborear ao longo desta reflexão, um Brasil menino, um adolescente que sem as orientações necessárias, e fruto de um Estado-Nação legitimado institucionalmente pela elite carcomida dos grandes portugueses, colaboraram para a solidão social, e o subdesenvolvimento mental de uma parte da população. Esta população da qual não somente fez parte Lima Barreto, da qual não somente foi vítima nosso protagonista, mas que podemos fazer uma lista enorme de grandes e incompreendidos figuras de hoje e de sempre, que atirados nos cantos de uma país descomprometido com os seus filhos, foram capazes de nascer e renascer milhões de vezes construindo poesia, música, literatura e tantas outras expressões culturais desse inconfundível Brasil, brasileiro.

Todas estas sensações, e estas emoções nascidas no tempo e no espaço do século XIX, no auge da construção dessa “brasilidade”, no discurso simbólico de um homem que pôde representar em sua narrativa a vida e a morte de um grupo de brasileiros marginalizados por uma estrutura social desigual.

O imaginário social brasileiro plasmado na obra de Lima Barreto se constituirá de encantos, desencantos, ilusões e desilusões de um período cíclico, histórico e não-histórico, nas contradições simbólicas de um “ente” vivo que fabrica imagens, mitos, almas e sociabilidades a medida que existe e colabora na formação de nossos costumes e de nossas tradições.

Buscar elementos característicos que fizeram de Lima Barreto, um modernista, é sem dúvida uma tarefa atraente, este rebelde para alguns sem causa aparente, e para aqueles que compreenderam sua obra puderam divisar em suas águas um universo de mágia, de injustiças sociais e de marginalidade. Um universo que nos aproxima de um Brasil de muitas cores, um país que nasce com Lima Barreto na capital do Brasil (Rio de Janeiro), esta cidade que víria a ser o palco das grandes transformações sócio-culturais que conheceríamos ao longo da história do Brasil.

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Lima Barreto narrou os subúrbios cariocas, e seus habitantes;os problemas de uma metropóle que despontava na inocência do seu olhar de menino, e de sua ingenuidade, pois se tivesse possiblidade de voltar e ver o que foi do seu querido Rio de Janeiro, ficaria tão pasmado quanto os seus habitantes de hoje; que transitam entre a riqueza e a pobreza dos morros cariocas. Um povo carioca que vive entre o medo e o desespero, fugindo de ”balas perdidas”,nas famosas “favelas” brasileiras, sinônimo da superpopulação das grandes cidades, do descompromisso de sucesivos governos e do egóismo da sempre intacta burguesia brasileira.

Este imaginário social formado pelas transformações radicais da história , dos seus grandes homens, e de uma maioria marginalizada, que cria e recria formas e formatos de vida. Assim sendo o imaginário nos transportará a este mundo real, concreto arquitetato a partir de nossas metáforas e do nosso modo de “fazer as coisas”.

A realidade sócio-cultural relatada na obra de Lima Barreto é o reflexo vivo do brasileiro de hoje e de sempre.

O imaginario social

A palavra imaginário: imagem, latina = icono, grego, reproduzem os objetos do mundo sensível sob o modo da representação. O signo é o mediador universal entre o homem e as coisas, símbolo, signo significante, é seu elemento terciário que possibilita o reconhecimento, o intercâmbio, a comunicação.

Depois dessa definação baseada na concreta e dimensionada simbologia do imaginário, buscaremos na obra de Lima Barreto o seu caráter humano, esta temporalidade que está marcada em sua narrativa; processo de uma experiência sofrida, dolorosa cimentada pelas doutrinas nacionalistas impostas pelo Estado. Estado este caracterizado por leis discriminatórias que eliminaram o elemento negro, e desconheceram o elemento”mulato”, como forma de determinar a superioridade de uma raça branca construtora de valores morais e materiais.

Nessa força criadora das representações sociais de um período que compreende o final do século XIX e ínicio do século XX, onde as personagens e a realidade destas criadas na dialélica de um ser como Lima Barreto originaram uma série de questionamentos socias em torno da figura do Estado brasileiro e de sua prática.
Sendo assim, é necessário compreender o imaginário social desde da perspectiva da história das mentalidades, pois nessa dimensão seremos capazes de perceber o quanto da identidade de um povo é imposta por uma instituição que condiciona o “reagir” e o “acionar” de um grupo social em pró de seus interesses e determinações.

Muitos são os investigadores que se dedicam a entender a sensibilidades dos tempos vividos, numa busca incansável de diagnosticar os elementos construtores da identidade nacional. No nosso caso particular a obra de Lima Barreto mais que um objeto de investigação se constitue em uma forma de reflexão sob o signo da diáspora interna dos processos sociais estabelecidos pelas nações através da figura do Estado, nesse sentido é bom lembrar que o imaginario social se constrói e reconstrói a partir das dinâmicas impostas por este conjunto de idéias criadas institucionalmente.

Embora o Estado se constitua em um ser determinante de condutas sociais, o fato de existir seres imaginativos que se confundem entre a vida social e os padrões culturais, nos faz pensar que é possível questionar esta estrutura a partir de alguns metódos criativos como a literatura ou qualquer outra expressão artística, compreendendo esta como um “vôo” de um pássaro sem limite que proporciona a criação de novas formas de sociabilidades.

Quiserámos utilizar alguns conceitos e definições de imaginário social na intenção de compreendê-lo como um reino de percepções diversas no qual construimos o mundo e efetuamos uma radiografia da sociedade em que vivemos.

O imaginario social concebido por Cornelius Castoriadis, por exemplo, não é a representação de nenhum objeto ou sujeito. É “a incesante e indeterminada criação sócio-histórica e psíquica de figuras, formas e imagens que proveém contéudos significativos e o tecem nas estruturas simbólicas da sociedade. Não se trata de contéudos reais ou racionais que adquirem uma vida autônoma se não melhor de contéudos presentes desde o ínicio e que constituem a história mesma, sugerindo a necessidade de re-examinar neste marco a história de nossas civilizaçõoes humanas.”(1)

Quando o filosofo Castoriadis afirma que os instrumentos para a análises da sociedade proporcionam os objetos para a mudança desta, nos conduz a pensar que “enquanto o imaginário do sujeito lhe proporciona ferramentas para análises da sociedade onde vive, também lhe proporciona ferramentas para transformá-las.”(2). É por esta razão que podemos estabelecer que a constituição do imaginário tem relação direta com a institucionalidade do Estado, e a fomação da nação. Pois a determinação do sentido, a função, a forma e o cárater do sujeito, são impostos pela legitimidade do Estado-Nação.

Para uma melhor compreensão, é necessário entender a idéia de que a ruptura da ordem estabelecida, assumirá um papel constitutivo de sensibilidades e sociabilidades inventadas em função da aspiração e desejos de novos sujeitos. Podemos traçar estas possiblidades no enfrentamento dos termos “rebeldes”. “ressentidos”, que são os termos mais utilizados para identificar a Lima Barreto em seu enfrentamento constante com a ordem estabelecida.

Segundo Castoriadis, a orden social na qual o sujeito nasce predestinado à aceitar os padrões de uma socialização, é integrada por uma “mãe”, que tem por objeto ajudar ao menino na adpatação ao mundo ao qual está chegando. Se a mãe é a responsável por esta adaptação significa que nela está depositada a função primordial de formar os sujeitos, baixo o prisma da sociedade em que vivem. Por isso é imprecindível que notemos que a construção da cultura e da conduta se herda através de invenções e re-invenções, parte concreta das lutas internas dos sujeitos que experimentam a vida social e sua complexa organização.

Em Lima Barreto, podemos identificar um imaginário social que será justificado segundo a tese de Castoriadis, na criação incessante e essencialmente indeterminada de figuras, formas, e imagens a partir das quais somente pode tratar-se de uma “alguma coisa”. Ou seja a obseção dos sujeitos em busca de um vago sistema de idéias que inspiram reações e juizos de valores extraordinários.

Lima Barreto ao transitar de um século ao outro, de vivenciar experiências radicais, tanto na sua vida como na vida do Brasil, não pôde deixar de ser um observador e reunir neste imaginário individual os aspectos metáforicas constuidos no interior de sua sociedade. Esta observação também marcada pelos cortes transformadores, mas também transgressores que influenciaram em sua vida, e determinaram em última instância a sua percepção do mundo.

As experiências de vida de Lima Barreto junto ao seu grupo familiar, sua devoção à leitura e sua liberdade nata por sobreviver na adversidade, quem sabe, será uma positiva forma que o levará a escrever e pensar como um ser humano representante de uma nação emergente, e voz sem querer sê-lo, de um povo que conhecerá os malefícios de um futuro visualizado por ele no decorrer de sua curta vida.

Este imaginário social brasileiro , é a capacidade de identificação que adquirem determinados sujeitos na transformação dos ideais existentes no interior da sociedade, que transformam em projetos sociais futuros, através das alegórias imaginativas que constroem.

O imaginario social brasileiro, pode ser definido e deslumbrado através do sacrificio, e a dor refletido na obra do autor que sendo autobiográfico segundo alguns dos seus estudiosos, puderam simbolizar o imaginário do povo brasileiro na reconstrução parabólica de uma realidade sonhada. Uma realidade que estranhamente se constrói desse imaginario individual, transformando-se em imaginario coletivo a partir das ações da sociedade que aparecem posterior aos questionamentos individuais.

É importante mencionar que imaginário não é algo racional, também não se posiciona num determinado contexto histórico. Embora estes fatores contribuiam para o seu desenvolvimento, imaginário é um processo permanente, é um espetáculo de lutas internas e externas que rodeiam a sociedade e os individuos configurando imagens a partir de suas percepções.

Esta “alguma coisa”, é a realidade e também é a “racionalidade”. Assim sendo, se conforma de uma rede de representações, que atravessam o conjunto do social e se cristalizam nas diversas formas de instituções com suas regras e funcionamento. Este ponto de articulação nesta fronteira entre o subjetivo e o social, desde do qual os sujeitos tomam posições em um determinado momento histórico, é a dispersão do sujeito em relação a sí mesmo, onde esta descontinuidade o faz ver lugares únicos e distintos.

Quais seriam então os elementos da obra de Lima Barreto que o identifica com o imaginario social brasileiro?

Os questionamentos e interesse de Lima Barreto se centram no bojo de uma sociedade de classes, sociedade esta herdada das experiências escravocratas, e das raízes carcomidas de um sistema feudal atrasado fruto da colonização portuguesa. Nessa perspectiva, e sofrendo os embates de ser um mestiço, graficando o conjunto daqueles seres discriminados dentro da “impureza” racial, constituindo assim o questionamento central da sua obra.

Lima Barreto, representante do Brasil “mulato”, representante de uma classe “impura”, segundo as teorias racistas do século XIX; nasceu em 1881 justo no ápice do movimento emancipação dos escravos. Um movimiento que culmirá finalmente com a Abolição da Escravatura em 1888.

Acusado por muitos críticos de manter em sua obra um “ressentimento social”, soube apreender a observar a sociedade brasileira, desde de suas próprias penúrias.

Será tão difícil entendê-lo? Ou dificil será aceitá-lo?

Para a elite brasileira nunca foi um problema desconhecerr o papel do negro na contrução da cultura brasileira. Nunca foi uma tarefa difícil para o Estado brasileiro difundir um discurso unitário, de que os grandes feitores da nação foram os portugueses, estes grandes homens que fizeram do Brasil uma grande nação. Este país idealizado, formado desde das elites, e para as elites foi também palco da criação de autoritárias teorias racistas que deram a forma e o formato ao “Racismo à brasileira”.

O racismo que se disseminou pelo Brasil está baseado no pensamento do Conde de Gobineau, diplomático e filósofo francês, cuja teoria racial centrava-se na superiodade da raça branca. Esta teoria também foi utilizada no século XX, dando forma ao que nos conhecemos como Nazismo na Alemanha de Adolfo Hitler.
É praticamente impossível falar em imaginario social brasileiro sem considerar a fisiologia das raças; seremos breves em alguns conceitos de dita teoria, o que pretendemos é somente caracterizar socio-culturamente o pais desde da chegada dos portugueses.

Mencionamos a Gobineau, primeiro teórico do racismo, que acreditava cegamente que a mistura de raças desembocaria no desaparecimento do elemento europeu, ele mesmo dizia, que não era contra a raça negra, era contra a mistura, esta mistura que faz desaparecer a superioridade do “animal criador”. O animal criador, sem dúvida, foi o elemento europeu, um dos seus fortes argumentos para descartar a criação de uma identidade sob o signo da “miscegenação”.

Partindo dos pressupostos de Gobineau, podemos comprender, que a ideología social adotada pelas autoridades brasileiras e o não reconhecimiento do elemento negro como formador da identidade , foi resultado das relações raciais nascidas de uma visão do negro como “animal “.

Esta postura radicada em uma estrutura social de classes, onde o senhor e o escravo estavam separados por um abismo social. Este “abismo” caracterizará a identidade socio-cultural brasileira, alimentando-se de valores raciais na formação do imaginário nacional.

Considerando a capacidade humana na construção da cultura como uma consequência complexa, revela-se uma surpreendente divisão social do trabalho; a sociedade brasileira, e sua introdução no universo capitalista moderno nos serve para identificar que este elemento econômico contribuirá de forma fundamental para a formação ideólogicada nação.

O sistema capitalista substituto do modo de produção feudal (escravista), concebe em suas fronteiras formativas os germes de um sistema anterior em que as transferências de um modo a outro se adpatam de acordo aos interesses da classe dominante.

Aqui é importante notar que apesar da liberdade alcançada pelos escravos, a ordem estabelecida, e os triunfos permanente do elemento branco encontrou eficientes mecanismos sociais para deixar o negro africano, e seus descendentes no lugar que sempre estiveram, ou seja, na base da pirâmide social. Aproveitando-se das regulações do trabalho livre, e das contradições do próprio sistema capitalista, não foi uma tarefa díficil desvincular-se da responsabilidade de um grupo do qual nunca foram responsável.

Pensando nesse sentido, e mantendo o horizonte do nossa proposta, a parte simbólica refletida no “que fazer” destes sujeitos é o espelho segundo o qual eles formaram sua identidade, e consequentemente inventaram os elementos separatistas que caracterizará o sistema como um todo.

Independentemente do sistema estabelecido estes sujeitos serão reconhecidos dentro provocando incomodidades no momento de desenvolver sua própria consciência de grupo, mas diz como Castoriadis : “imaginario social é o reino da identificação espacial que inicia-se no estado do espelho, é um instrumental no desenvolvimento da agência psíquica. É nesse processo que o sujeito pode identificar sua imagen com o”eu” diferenciando-se do “outro”.(3)

Por outro lado Branislaw Baczo, em seu ensaio “Les Imaginaires sociaux,Memoirs et espoirs collectifs”, elabora um conceito de imaginário que faz parte integrante da legitimação de qualquer regime político. Por meio do imaginário o povo pode alcançar a cabeça, e também o coração, e se é assim podemos dizer alcançar, as aspirações, os medos e as esperanças sonhadas. É nele que as sociedades definem suas identidades e objetivos, definem seus inimigos, organizam seu passado, seu presente e seu futuro.

O povo elemento importante de uma nação, não se constitui somente de elementos tangíveis, os elemento intangíveis aqueles que tocam a sensibilidade, e a emoção refletem um tempo, um espaco que eleva e diferencia as épocas e a história. Nesse processo de construção do imaginário social e das sensibilidades dos sujeitos, nos incumbe entender como os sujeitos são capazes desde de seus espaços de representação de construir imagens e realidades, metafóricamente dadas, por un canal de experiências e desejos anônimos, que finalmente contribuem de forma coletiva para a formação da identidade nacional.

O fator regulador e estabilizador dos modos de sociabilidades existentes na legitimação do Estado como entidade controladora, não são definitivo, podemos penetrar em um mundo de heróis, visões e idealizações de uma sociedade futura.O imaginário por ficção ou verdade existira na mente do sujeito e o transformará, reflexo deste “paraíso imaginado”.

Dessa forma não é difícil pensar que um dos pontos a questionar é, quem sabe, entender que se Lima Barreto (nosso imaginario social), filho da indiferença, dos ideais de uma sociedade de classe, pode-se adiantar a uma imagem de um Brasil futuro, e a um presente construido desde de sua narrativa povoada pelos os seus próprios heróis, e antí-heróis do povo, é transcendente mostrar que apesar da exclusão sofrida por ele como ser anônimo, podendo construir elementos de identidade e imageneria.

No nosso caso particular quando chamamos imaginário social, pensamos no discurso e na palavra narrada na obra de Lima Barreto, que busca atingir uma classe, e submetê-la ao juízo social reservando ao negro e ao mestiço a possiblidade de existir no contexto de classe.

Compreender a degeneração da raça negra, o extermínio indígena e a escravidão no Brasil, são pontos importantes na hora de considerar uma reflexão dessa natureza.

A construção do imaginário social brasileiro, carrega simbólicamente as marcas reais e fictícia de uma civilização européia herarquizante na qual as relações sociais era marcada pela desigualdade durante toda a Idade Média.

Ao se aproximar da obra de Lima Barreto, o primeiro que notamos é sua triste e incompreensiva condição de mulato, fruto da mistura de raças. Sendo centro da horrosa criação da mistura, sobreviverá através de sua obra graças a um projeto de sociedade fictícia que nascerá de sua biografia, construida e edificada nos traços imperfeitos de sua curta vida.

As desilusões racias no Imaginário social brasileiro

Logo da Independência do Brasil em 1822, passaram alguns anos para que chegasse finalmente o fim do trabalho escravo. Com uma economia baseada no mercantilismo, foram os negros trazidos desde da África que justificaram de certa forma esta economia mono-exportadora.

Os negros africanos foram os principais protagonistas da adversidade de um sistema de castigos e maltratos, que em nome de uma doutrina evangelizadora se arrasta pelo Brasil durante todo o período colonial.

O espaço desenhado e criado pelas doutrinas jesuísticas,por exemplo, dentro da empresa colonial portuguesa, se legitimaram a medida que a acumulação de riqueza representou o ponto culminante deste modo de produção.

Os jesuitas levaram a sério o papel que destinaram-lhe dentro desta exitosa empresa, principalmente quando viram parte de seus objetivo cumpridos. O de evangelizar os índios “sem alma”, e os negros “enfeitiçados”.

Este sistema colonial é composto por um conjunto de relações sociais , geradoras de valores morais e éticos, implementados por um sistema educacional doutrinário.
A situação do negro no Brasil, e as armas desta empresa colonial, de caracteristicas feudais, foi e segue sendo aspecto relevante na hora de analisar a ação dos sujeitos na formação da cultura e da identidade brasileira.

A ideologia de ascensão burguesa impregnada na sociedade colonial de forma transversal, ocupará um papel importante como elemento emancipador dos escravos, sendo esta uma tentativa sólida na mudança do panorama da economia brasileira.

Por outro lado, utilizando os mecanismos narrativos de Lima Barreto para esta análises na qual recorre à irônia, e a um sarcasmo grandioso, mencionando que os escravos livres, posteriormente foram condenados a pobreza e a miséria são parte de uma alegória necessária para legitimação de uma estrutura de classe burguesa, que degrada ao negro e aos seus decendentes.

Nesse sentido admitir que os escravos poderiam ter tido um lugar na sociedade brasileira pós- abolição, é pensar que esta classe burguesa reconheceria, de algum modo, a brutalidade do sistema anterior, substituindo-o pela sensiblidade e a grandeza de um novo homem.

É impressionante do ponto de vista das idéias ver que os próprios aboliocionistas, meninos da classe burguesa, pensando no futuro do país, com conhecimento de causa, lutando disfraçadamente por um país justo não incluiram em suas reinvidicações a garantia de uma vida digna para os escravos livres.

Tudo isso nos faz pensar que o movimento pela libertação dos escravos iniciado no Brasil no século XVIII, foi de forma gradual desde da sua primeira tentativa em 1850 a partir de uma abolição gradual, depois com a lei do Ventre Livre em 1871, a lei dos sexagenários em 1885, e a lei Auréa em 1888, um movimento passivo de caráter mundial, sem nenhum traço de particularidades internas, somente consequência das mudancas mundiais economicas propostas pelos ingleses.
Não obstante, não podemos deixar de resgatar o respeito por todos aqueles que se atrincheirando nos parlamentos nacionais, em busca de soluções dignas para este vergonhoso regime economico. Podemos mencionar nomes como Joaquim Nabuco, José do Patrocinio, Rui Barbosa entre outros.

A narrativa de Lima Barreto denuncia as hipócresias criadas com a ruptura do sistema escravocrata, se aproxima da tese de que o homem negro ganhou liberdade, para buscar um espaço de sobrevivência que dentro do novo sistema está reservado apenas para “alguns”. Estes “alguns”, que precisaram de tempo, paciência e coragem para enfrentar um mercado livre, de homens livres que buscaram formas de alcançar uma liberdade jamais alcançada.

Pensando nas imagens criadas, e representadas na literatura de Lima Barreto com seus professores de javanés, com seus quixotes de la mancha, com suas Clara dos Anjos e outros mais, somente nos resta analisar sua obra baixo o signo dessa desigualdade; metafóricamente construida com base nas hipócresias de um sistema que criando já o operário, evitará as responsabilidades com o homem e com a liberdade deste, aprisionando através de eficientes manobras bem intencionadas conhecidas já por todos durante os séculos seguintes.

Falar de liberdade é um desafio dentro do sistema capitalista que nasce sob as “luzes de modernidade”, pois as contradições deste mostrará as incertezas de um homem livre que não saberá nem como, nem para que lhe deram a sonhada liberdade.

Liberdade para que?

Liberdade para procurar um novo horizonte, liberdade para procurar um novo espaço, deparando-se com uma potente ideologia dominante, que lhe criará mais armadilhas incompreensíveis que o sistema anterior.

É importante pensar que o imaginario social o qual induzimos é a identificação do escritor com um mundo de representações sociais, que o leva a questionar a possibilidade real deste homem livre, e o seu papel como cidadão no interior da sociedade.

As desilusões com a sonhada liberdade do ex-escravo, se depara com a triste idéia de que o novo sistema criado é mais eficaz, e tem característica eficientes no processo de destruição das capacidades mentais, física e espirituais deste emergente homem.

A complexidade do tema é enorme com respeito principalmente aos fatores sociais e econômicos, e as disparidades de um modo de produção perfeito na sua genesis destrutora.

Todos estes elementos nos fazem refletir sobre a vida, e a morte de Lima Barreto. Pensando que esta figura tão pertubada, carrega o estigma de um sistema selvagem que muitos suportam e poucos gozam dessa “ilusão”, a felicidade perfeita que se propaga dentro dos ideais do novo sistema.

Se ao negro livre não lhe destinaram espaço na sociedade brasileira, é por que existem formas matemáticas e lógicas, que obviamente vão além da história, remetendo-nos à fragilidade de uma classe social que sempre se manteve no mesmo lugar, somente mudando de lado. Nesse sentido, buscamos somente o nexo entre homens negros-livres, os quais o Estado moderno inventou e desinventou de acordo as políticas constitucionais que criou.

Como em um país de homens livres e modernos, baseado no Estado de Direito alguns homens morreram de fome, de sede e de melancolia?

Só pode ser reflexo de um instrumento de dominação que virá substituir os castigos físico por outros ainda mais eficientes. Assim sendo, tomando a figura de Lima Barreto e suas personagens de volta ao nosso caminho de reflexão, nos nasce a idéia de ver ilustrada em sua narrativa a vida ilusória desta classe social que alimentou e alimenta até os nossos dias a esperança de alcançar a liberdade.

Mais que compreender a obra de Lima Barreto como foco de proposições anti- racistas e rebeldes, é importante perceber que este ser humano incompreendido, fruto das atrocidades do sistema, acionará mecanismos de sensiblidade social, sendo este capaz de perceber o mundo e a vida desde de uma perspectiva futurista. Nos referimos a sua capacidade crítica, que deixou marcas indelevéis na literatura social.

Esta condição supõe percepção sensível, talento nato para decifrar este mistério da vida e justificá-la a partir da experiência própria. Grandes escritores no largo da história foram capazes de relatar suas experiências de vida, transformando os seu problemas existenciais em um grande problema universal. Para isso, no entanto, precisamos aquela liberdade interna, aquele imaginário indecifrável no qual construimos, e destruimos objetos a medida que os encontramos.

Ser livre é criar, e re-criar este imaginário fictício, que dá elementos reais de construção de espaços de identidade. Espaços únicos e particulares.
Este grau de liberdade que era “ser” para o autor, passou de uma imagem de homem castigado , acurralado por uma sociedade de castas, a finalmente um homem consumido pelo medo, e o desespero que opta por “ir embora”, buscando lugares de escapes, reais e ilusórios nesta liberdade criada e utopicamente construida.

A vida de Lima Barreto, é uma vida de sacrificios, dores, mudanças e tragédias. Sim tipicamente brasileiras. A grafia é nossa.

Este “tipicamente brasileiro”, podemos empilhar em uma série de relatos que vão desde da figura de Zumbi em 1635, até a figura de Cartola em 1930. Figuras atrás de figuras que nascem e renascem nesse mágico território de mágias, que é o Brasil.

As realidades adversas enfrentadas pela mestiçagem cultural, traçaram-lhes um destino cheio de necessidades, lutas e esperanças. Elementos simbolicamente construidos pela mística deste de um ser esperançado e cheio de fé. Considerando a beleza intrínseca da obra de Lima Barreto, apesar dos seus amargos relatos resultado da sua condição social, nos transporta a tentativa de compreender a vida de anônimos personagens que ao longo da história da nação, desapareceram ética-moralmente dentro de um contexto histórico de previlegios, do qual o escritor foi vítima, assim como seguem sendo 50 milhões de brasileiros até a atualidade.

As observações narrativas de Lima Barreto na construção do imaginário social brasileiro, então tomam forma quando cria personagens caracterizadas por uma realidade intrínsecamente popular.

A embriaguez, a loucura, a inompreensão, a indiferença personagens fictícias que percorrem as ruas das capitais brasileiras em pleno século XXI, foram os ingredientes da obra do assustado e inteligente Lima Barreto. De certa forma os críticos mais destruidores da sua obra são aqueles governantes católicos, conservadores que não suportaram ter que admitir que no mais alto pico das letras brasileiras pudésemos ter a um ressentido social, combatendo os preconceitos raciais da forma mais previlegiada, desde da tribuna da literatua.

Os grandes homens são aqueles que podem ter uma visão do futuro, isso fez Lima Barreto. Junto a ele , podemos colocar também tantos outros personagens fictícios como Machado de Assis, Aluizio Azevedo, que nascidos nos subúrbios da corte portuguesa somente poderam haver concebido alusões a um homem imaginário. Homens tantas vezes negados na constituição literária da nação, hoje reconhecidamente pilares importantes de nossas letras.

A convivência entre brancos e negros no Brasil foi intenso, reconhecer estas práticas sociais no século XIX , foi um grande golpe para burguesia brasileira. As relações socias nascidas desse união étnica foi resultado sem dúvida da possiblidade que ambos grupos encontraram na criação de uma nova forma de sociabilidade. Independentemente que estas nunca foram reconhecidas pelo Estado.

A obra de Gobineau A diversidade moral e intelectual das racas, de 1886, cuja tese centra em que o fim da escravidão foi exatamente para impedir que esta mistura continuasse existindo, deixa em aberto que em 200 anos de história o povo que supostamente deixaria de existir pela miscegenação, pôde superar algumas barreiras e continuar seu caminho a “trancos e barrancos”, apesar da tese do “pai do racismo moderno”, o conde Joseph Arthur de Gobineau (1816-1882).

No nosso trajeto reflexivo, é praticamente impossivel resgatar os “porques”da escravidão no Brasil e suas consequências. Esta memória do saqueio social já se escreveu de muitos maneiras nas ciencias sociais brasileiras, mas nunca está demais dizer que o previliegio de uma classe sobre a outra são os ideais de uma empresa colonial implantada no Brasil no qual o negócio da escravidão enriqueceu tanto aos portugueses como outros povos no século XV e XVI. Aos negros resta-lhes pensar que independentemente das condições do tempo histórico, existiram seja para o trabalho, ou para fomentar uma realidade de torturas, de violência e misérias que serão símbolos tormentosos na hora de configurar o passado e reconstruir a memória do povo brasileiro.

Os Majores Quaresmas, de O triste fim de Policarpo Quaresma, existentes no Brasil representantes de um nacionalismo demostrado na desigualdade de uns que se preocupam, e outros que pensam em si mesmo, é o ponto crucial da obra de Lima Barreto. Este anti-herói que se constrói em críticas retiradas de uma loucura real da narrativa, mas que em contrapartida se dilacera com o cômico e o irônico de uma personagem que marcará a sua obra e o definirá como um nacionalista.

A linguagem adotada pelo autor se aproxima da linguagem coloquial dos cariocas, mas também podemos interpretar como uma forma de provocação, em uma época em que as regras gramaticais e estruturais da língua portuguesa prevalecia como fator de conhecimento e moral.

A obra do escritor não foi merecedora no momento de sua publição de reconhecimentos, e ele também não foi galonardo como bom ou mal escritor, simplesmente foi ignorado baixo o signo da diáspora social, sendo vítima de um sistema de valores que mais que admirar aos homens, preferiu não emitir opinião, pois esta pelo fato de existir já significaria um passo na concepção de que um mulato poderia escrever.

Opiniões à parte, e pensando em tantos outros negros e mulatos sofredores desse processo social exterminador, nos resta pensar que reconhecer o talento literário de Lima Barreto era reconhecer que os mulatos podiam fazer parte dessa elite das letras destinadas a uma pequena parte previlegiada. As palavras não se limitam a “reconhecimento” e “merecimento”, todo este processo de degradação passa por um contexto social determinado.

Quem é brasileiro, mulato, pobre e esforçado saberá do que estamos falando. E olha que estamos escrevendo remetendo-nos ao ínicio do século XX.

Estamos falando de uma brecha social, que reinou e reinará na sociedade brasileira; colocando o elemento negro como a “sobra” , “o que ficou”, e nao foi absolvido. Este conjunto de homens livres negros que sobraram daquele antigo regime escravocrata.

Lima Barreto construirá personagens sinceros, lutadores, nacionalistas, queridos , homens e mulheres com qualidades e dignidades longe da indiferença da realidade.
A vida diária do brasileiro comum relatada na obra de Lima Barreto, mostra o homem lutador componente dessa pátria ingrata, que luta para sobreviver nesse espaço de indiferenças. Construindo elementos encantadores, transformadores de idéias e ideais que estão intrínsecamente marcado nas linhas escritas pelo autor, levando os sujeitos a perceberem, que fazem parte de um todo diferenciado e escalonado na medida em que têm consciência de sua condição social.

Este Brasil, descrito por Lima Barreto também fará de nosso protagonista um homem adorador de sua terra, esta é a sua marca nacionalista. Enquanto idolatrará a terra na sua obra, esta o desconhecerá por completo, sendo ele pessoalmente aquele que tentará encontrar os mecanismos para que ela o ame.

Um trecho de O triste fim de Policarpo Quaresma, nos faz perceber que o próprio personagem deixa escapar esta sua condição de adorador do Brasil e da língua portuguesa. Mesmo que esta seja apenas um empréstimo europeu.

«Policarpo Quaresma, cidadão brasileiro, funcionário público, certo de que a língua portuguesa é emprestada ao Brasil; certo também de que, por esse fato, o falar e o escrever em geral, sobretudo no campo das letras, se vêem na humilhante contingência de sofrer continuamente censuras ásperas dos proprietários da língua; sabendo, além, que, dentro do nosso país, os autores e os escritores, com especialidade os gramáticos, não se entendem no tocante à correção gramatical, vendo-se, diariamente, surgir azedas polêmicas entre os mais profundos estudiosos do nosso idioma –usando do direito que lhe confere a Constituição, vem pedir que o Congresso Nacional decrete o tupi-guarani como língua oficial e nacional do povo brasileiro».(Capitulo III A ntícia do genelício – Triste fim de Policarpo Quaresma).

Lima Barreto : Imaginário de uma época

Lima Barreto nasceu justamente no período em que no Brasil se travava a luta pela abolição da escravatura. Na sua biografia mais completa feita por Francisco de Assis Barbosa A vida de Lima Barreto, há uma cena “de mãos dadas com seu pai saem a comemorar a abolição e a liberdade dos negros”.

Ele tinha nessa época 7 anos. Marcado pelo espírito da liberdade, e esta é uma expressão que temos utilizado ao longo desse ensaio pois este acontecimento o influenciou. Primeiro pela importância histórica, e outra pela transcedência que provocou em sua mente.

Com uma vida cheia de altos e baixos não diferentes de muitos dos nossos compatriotas, viveu entre o sossego e a desordem. Amante da leitura, da observação, foi um menino bem tratado pelo pai e pela mãe, apesar que esta o deixou muito menino. Tendo convivido com os meninos mimados da burguesia carioca, pôde perceber entre o bem e o mal através da capacidade do ser humano sobreviver em uma sociedade de classes. Viveu sempre isolado por sua própria boa vontade, como diziam seus próprios colegas do colégio, pois nunca gostou muito das amizades.

Com uma vida bastante mutante, viveu em diferentes lugares, teve seu destino mudando o final a todo momento. Nunca sabia o que ia acontecer na sua vida.
Quando morreu sua mãe aos sete anos, ou quando o seu pai adoeceu. Uma doença que o fez sentir-se perdidamente confundido. Logicamente a loucura do seu pai não trouxe para o ser humano Lima Barreto episódios muito alegres. Mais do que cuidar do pai e dos irmãos os quais se encarregou muito cedo, marcando para sempre a vida e o destino deste jovem que a borde da desesperança, opta por ser responsável de uma realidade fatal.

Com a doença do pai, que tem que ser internado em hospícios, e obriga a familia a mudar de casa pelos problemas que acarreta a doença, Lima Barreto se viu obrigado a conviver com a rejeição das vizinhança, o temor de um pai doente mental, e desesperança de uma familia que via ir pela borda o futuro.

Todos os biógrafos do autor concordam no seguinte: que a ele foi muito marcante o fato de ter de cuidar e responsabilizar-se por seu grupo familiar muito jovem. Dizer que a depressão que avassalou a sua vida , foi provocada por estas responsabilidades é não perceber também a visão que ele tinha do seu entorno.

Em algumas de suas obras Lima Barreto vai colocar sua amargura como resultado de um regime de governo (A Republica Velha), e de um abismo real entre a classe dominante e o povo contemplando seu feitio. Lima Barreto não teve uma vida fácil, quando pensamos que apesar de ter tido uma boa formação graças a ajuda de seus padrinhos influentes, foi um menino que conheceu de perto a mordomia dos seus colegas de escola, e as dificuldades de um lar desintegrado. Desta forma não foi uma pessoa muito feliz pelos contrastes existencias que teve que viver.

Em uma frase que pertence ao seu Diário Intimo ele diz:
«Desgraçado nascimento tive! Cheio de aptitudes, de boas qualidades, de grande e poderosos defeitos, passei a vida sem haver feito nada. Vivi sem afeto e morrirei amargado. Haveria sido uma vida grande se eu houvesse feito grandes obras; mas não fiz”.

Estas palavras denotam uma baixa auto-estima. Uma auto-estima de abandono, e tristeza. Lima Barreto viverá em um transe entre a vida, o abandono e morte e utilizará o álcool, e a boêmia para satisfazer seus sentimentos de preságio de uma desgraça que estava por chegar.

Um preságio que virá como uma morte anunciada a um ser incomodado com a própria vida. Lima Barreto lutou com o álcool, mas perdeu a batalha. Se atreveu a teve coragem de editar sua própria obra como é o caso de Triste fim de Policarpo Quaresma, e em 1916 pode dar ao público mais uma de suas brilhantes histórias. Mas os anos no álcool, e na apatia permanente o conduziram como ao seu pai à loucura. São dez anos de tragédia, que finalmente o levaram a morte.

O fato de Lima Barreto ser mestiço, o que para muitos de seus estudiosos não radica em uma condição para não ser aceito, mostra que apesar de seu talento , o levaram a sentir-se decandente dentro de uma sociedade brasileira racista, que expelindo aos negros e aos mestiços, daria a idéia máxima da “brancura”, como condição de progresso. Ser “branco”, é um estado de intelecto, e sucesso.

A obra de Lima Barreto centrando-se em uma grande dose de crítica social
e política, fará com que o classifiquem de “rancoroso”, além disso pela despreocupação com que escrevia, sua narrativa provocou muitas reações por parte daqueles que buscando uma estética na literatura, a partir da bem constituida língua portuguesa, eliminaram as possibilidades de posicioná-lo dentro deste grupo elite das letras nacionais.

Estes fatos na vida de Lima Barreto o levam a trabalhar nos campos de um imaginário e passear por um passado que o persegue, um presente destrutivo e um futuro incerto. Sendo observador do desenvolvimento de uma sociedade brasileira radicada em um escandoloso racismo, em que os previlégios de classe são visíveis aos olhos daqueles que querem ver, opta por uma postura extremamente rebelde. Defende os direitos dos homens livres , denuncia esta estrutura social , e utilizando uma irônia que lhe será caracteristica, encontrará na literatura uma forma de demonstrar sua impotência diante dessa poderosa estado de coisas.

Vivendo em uma espécie de neurose, não tendo a total certeza que esta literatura o salvará deste mundo injusto, se alimentará dia-a-dia junto a este povo injustiçado dos desencantos dessa pátria ingrata.

Os desencantos construiram uma forma de “ver o mundo”, para este povo brasileiro que entre o terror e miséria inventaram “um jeitinho” , encontraram com um “jogo de cintura”, formas de enfrentar esta caótica realidade.

Não podemos afirmar que a maioria dos brasileiros vivem hoje, ou sempre viveram sob o signo da depressão profunda, seria uma calúnia, quando desde das expressões mais significativas que o podem caracterizar puderam inventar as mais sublimes beldades no campo da música, da dança e das festas populares.
Nesse sentido e pensando na possibilidade dessa força propulsora, criada na filosofia interna deste povo desacreditado, é de total importância notar que o imaginario social criado na obra de Lima barreto passa por aspectos de um Brasil criador de emoções necessárias para o enfrentamento dessas situações de contrastantes.

Considerando que Lima Barreto, no ritmo da adversidade de sua condição de mulato e pobre pôde dar passos importantes quanto a formação literária, nos sucumbe e ao mesmo tempo nos incumbe notar que sua construção da realidade ajudará a formar um “brasileiro” na sua obra , que apesar dos sacríficios e da dor de não poder “ser”, enfrentará o mundo, e se encantará com o desencanto e a magia na construção dos chamados “espaços de inclusão”.

Assim sendo, quando falamos de imaginário social, estamos nos referindo a esta força energética, que cria e recria, rejeita e contrae, parecendo existir e não existir nos complexos campos da cultura e da formação dos povos.

Assim o Major Quaresma, de Triste fim de Policarpo Quaresma, indica segundo o autor que os simbolismos de um país guardado no querer, no respeito e no silêncio de uma classe conforma,e ao mesmo tempo, desola as atrocidades do tempo, sobressaindo a dignidade de seres lutadores e conscientes de quem são.

A história mostra os generais, as guerras e aos governos. Se fízéssemos uma história das sensibilidades humanas, onde os generais choram, e o povo canta, poderíamos recorrer sempre a literatura para constatar a sensibilidade do tempo histórico.

“Os bem-vestidos e os mal-vestidos, os elegantes e os pobres, os feios e os bonitos, os inteligentes e os néscios, entravam com respeito, com concentração, com uma ponta de pavor nos olhos como se penetrassem noutro mundo”.(Capitulo I – A lição de violão).

Estes feios, bonitos, brancos e pretos representam os brasileiros de primeira e segunda classe imaginados e trasnformados na obra de Lima Barreto em homens dignos e potenciados de valores e príncipios.

Realizando uma descrição prévia das obras de Lima Barreto, e tentando resgatar com um mínimo de subjetividade as suas personagens, queremos apenas recordá-lo como um ser pertubado pelo seu tempo, e pela sensibilidade deste, que nos transportou pelos caminhos dos questionamentos do que é “ser brasileiro”.

Esta pergunta se constitue sem dúvida num forte enigma quando pensamos no que é a cultura brasileira e como esta se edificou. Mais que orientar-nos àquela velha discusão do negro, do branco e do indígena, o importante é saber que este tempo passado está mais presente do que nunca, marcando profundamente a uma parte da população brasileira que vê o seu destino sendo traçado por uma poderosa elite desde de remotos tempos coloniais.

A preocupação principal do autor em criar personagens populares como é o caso de Clara dos Anjos, uma mulher que enfrenta o preconceito racial no subúrbio do Rio de Janeiro. Clara dos Anjos, é a possilbidade real do autor de denunciar a condição de ser mulher, mostrando uma jovem seduzida e enganada por uma rapaz de uma classe social melhor que a dela, sendo esta simbologia a categoria do oprimido na condição de pobreza e gênero da época.

Passados já 87 anos desde da morte do escritor brasileiro, continuamos vivendo em uma sociedade de oprimidos e opressores. Assim nosso reino do imaginário,está povoado de sobreviventes deste caos social, representado por homens e mulheres diferenciados étnico-sócio e culturalmente.

Interferir no imaginário social, desde do ponto de vista histórico é tarefa destinada a um sujeito real, um sujeito histórico; certamente desde da disciplina não poderemos tocar pelo subjetivo do nosso tema. Mas consideramos que os sujeitos sociais através das suas ações conseguem mudar em algum grau de figuração a estrutura social a que estão submetidos.

Acreditamos que Lima Barreto foi um grande nome no pódio da imaginação social brasileira. Imaginou uma sociedade real para o povo oprimido, e com discernimento viu os problemas comuns daqueles individuos, que como ele sofreram um grau de insatisfação social. Este conjunto de situações avaladas e consumadas legalmente pelas elites coloniais, certamente, foram os questionamentos permanentes do autor. Poderíamos chamar esta tendência de pensamento “nacional”?

Nossa idéia foi definir o imaginário social, transitando entre os conceitos e as metafóras, utilizamos concretamente a Cornelius Castoriadis, filósofo grego, por que pensamos que sua postura diante desse homem “construtor”, se aproxima da idéia de que a construção de utopias, nos ajuda a fisgar este mundo. Quem sabe na imaginação de alguns podemos fundar nossa identidade.

Pensamos que Lima Barreto com suas personagens e realidades recriadas, foi capaz de representar um Brasil classista, racista, e injusto. Este mundo pobre e isolado destinado aos homens negros e mestiços, estes homens livres de valores e moral. Estes homens que levantam pilares de concreto na construção das casas, mas que não participam das abstrações sócio-politico-culturais.

O imaginário social e o “ser brasileiro”

Muitos se perguntam o que é ser brasileiro. Muitos se questionam o que é sentir-se brasileiro, também nos perguntamos o que é ser e não ser brasileiro. Com certeza não temos respostas a esta pergunta, mas vamos tentar através das contradições refletir sobre a pergunta.

Quem sabe ser brasileiro é levantar-se cedo e enfrentar a um trem lotado no subúrbio carioca ou paulista, quem sabe é escutar samba, ou comer feijão com arroz. Quem sabe ser brasileiro é morrer de fome na seca nordestina? Ou quem sabe é brilhar nas passarelas do samba? Mais do que isso, quem sabe é “torcer” pela seleção brasileira de futebol. Ah! E aquela cervejinha no final da tarde. Será que isso é ser brasileiro? Quem sabe tudo isso é ser brasileiro.

Será que ser brasileiro não seria algo mais complexo?

Quem sabe as investigações dentro do panorama das ciências sociais, da literatura e das artes em geral tentem todos os dias responder a estas perguntas. Antropólogos, sociólogos, historiadores, e tantos outros que levam anos buscando esta resposta. A cultura brasileira.

Mas todos coincidem que o Brasil é um país de diversidade.

Pensamos no Brasil, no seu território, no seu complexo caminho por chegar a ser uma grande nação.Então temos a possibilidade real de discutir e refletir sobre o que se concretou daquele pensado Brasil do século XIX, símbolo de lutas sociais que culmiram com a abolição da escravatura. Será que este Brasil de Joaquim Nabuco, de José do Patrocinio, de Rui Barbosa nunca existiu?

É preciso saber que este Brasil imaginado e questionado por tantos, foi o Brasil que viu nascer a Lima Barreto. Foi o Brasil que o viu desmilinguir-se pelas ruas da cidade do Rio de Janeiro, que assistiu a sua infelicidade, e deixou que este angustiado homem chegasse as fronteiras da loucura. Não saberia dizer quantos são os loucos dessa terra, nem quantos foram internados, e estão a ponto de sê-lo, mas poderia intuir que provavelmente esta biografia da qual nos alimentamos possa ter sido escrita muitas vezes.

Não pelos intelectuais, não pelos estudiosos, mas nas páginas dos jornais do país que cumprem em informar as carências e indiferenças já assumidas nesse processo político violento e draumático.

Não deve ter sido fácil ser filho de um doente mental. Não deve ter sido fácil ser catalógado de “mulato”. Não deve ter sido fácil ver que uma sociedade crescia a base da hipocresia. Não deve ter sido fácil ser filho de uma nação mal agradecida. Mas deve ter sido muito fácil para esta nação criar milhares de “João Ninguém”, de “pés de chinelos” , de pessoas que que não tinham onde “cair morto”.

Nos colocamos no lugar de Lima Barreto, e o único que nos faz sentir é medo, é frustração, é angústia, é melancólia. Mas neste país do samba, que depois se transformará no país do futebol, e em seguida no país do carnaval, é um sábio país. Tão sábio como o “sábiá que sabia assobiá”.

Sabe por que? O racismo vai corroer todas as instâncias da vida social, e paragens distantes da vida nacional, vai transformar-nos em castigados e castigadores, em torturados e torturadores,e nós levará a criar uma espécie de sentimento, de emoção que sangra e corrói a gritos as possiblidades de vida, e então vamos sorrir.
O racismo mais que a negação do ser humano, é a impossibilidade de vida.

Com criticas tão certeiras, com argumentos tão perfeitamente construidos, Lima Barreto contribuirá na criação de uma realidade para “brasileiros”, inventando o verbo “brasileirar” , com um centro único : o homem do povo.

Querendo ou não,recopilando informações a respeito do imaginario social, podemos qualificá-lo de muitos nomes, poderíamos dizer: Samba, futebol, música, arquitetura, enfim milhares de palavras,que nos serviriam para identificar este gigante que é o Brasil. Mas partamos do samba.

E o samba?

Esta mestiçagem real musical que simboliza o saber, o querer, e o sentir de várias etnias, de várias raças em um mesmo território. Este saber,que ainda bem, muitas autoridades reconhecem como nossa particularidade, como nossa verdade.Ou será que são os sambistas que pensam assim?

Ser brasileiro, é sentir e sonhar nesta imaginada e inconclusa nação, concebida por um processo histórico baseado nas injustiças sociais, onde os direitos humanos foram atropelados, em que a corrupção é campeã de vendas, que embora tenham tido possiblidade de criar uma sociedade diferente optaram pelo o lado mais fácil. Eliminando uma camada da população,ou dando a esta as migalhas, as sobras de um sistema que extermina silenciosamente e na legalidade constitucional uma parte dos seus habitantes, os negros e os mestiços.

Porém quando falamos de um Lima Barreto, claro e leal, fiel e nacionalista falamos de um mestiço, que procurou ver a nação também como referência, como referente de valor. Em sua obra mais que denunciar uma dignidade que nunca existiu para o negro livre, e para o mestiço relegado, percebeu que o negro continuou sendo tão ingênuo, e inconsciente de sua condição quanto aquele negro sequestrado na África. Nenhuma personagem de Lima Barreto é livre.

Suas caracteristicas esbarram na criação de um mundo fictício de isolamento, e abandono que se edificam na fábrica de sonhos do autor, que pensando na abnegação de suas personagens nos faz refletir quanto, e quando terão um destino diferente. O destino nunca chega, e se chega é a morte anunciada.

A morte presente na sua obra é o imaginario social do fim do mundo. Se pensamos naquele escravo abatido, naquele escravo torturado em que o final mais digno é a morte. Só nos resta pensar que a vida é um sacríficio real, doloroso e impossível. É o imaginário do desencanto.

Em um mundo de negros, brancos, e mulatos o paraíso, o inferno e o purgatório como dizia um teórico racista só está para classificá-los, quem vai entrar aonde. Bom não é nada dificil adivinhar.

Na ficção de Lima Barreto,os mulatos pensam e escrevem livros, criam personagens, e realidades sociais. Se o intelecto do negro, e do mestiço “daquele mulato”, é menor do que a do branco que manda, então como reconhecemos a inteligência na mistura?

Neste prisma, Lima Barreto e sua obra denunciam através de um levantamento de
dados,que visam colocar o negro como elemento inferior intelectual e moralmente. Na sua obra o escritor demonstra que o negro, o mestiço também foram capazes de inventar e re-inventar a realidade. Apesar da adversidade.

O imaginário social brasileiro construido a partir das adversidades, das lutas, das desgraças, e destas calamidades fatais é fruto de um protagonismo racial que será denunciado na sua narrativa.

A tragédia da vida de Lima Barreto, o álcool, a miséria, a loucura e a morte foram elementos simbólicamente transcendentais, para notar e analisar os aspectos particulares da cultura brasileira em um caminho de pedras, cavado no deserto de um país poderoso, enriquecido pela natureza que pouco a pouco foi denegrindo em uma imagem divisória, construindo em seu interior diversos países, diversas nações.

O país que Lima Barreto denuncia, é o seu imaginário social da calamidade, não é o mesmo país construido pela burguesia e seus aduladores. Este país retratado na sua obra é o mesmo país que se desmilingue nas favelas e nos becos, e que constitui um parâmetro importante na constatação de uma sociedade brasileira que barra na indecência e na imoralidade.

Ser brasileiro e imaginar-se brasileiro é uma reinvenção diária. É apreender a comer pão e pedra, e conviver numa realidade de cognições sociais construida com base na penúria, na desgraça e na miséria. Entretanto, quando Rachel de Queiróz recria a realidade do povo nordestino, ou quando Guimarães Rosa nos deleita com as suas personagens valentes, ou mesmo o Euclides da Cunha caricaturiza o sertanejo prequiçoso nos faz pensar que o Brasil é um modo de “fazer as coisas”, como diz Roberto da Matta. É muito mais simples do que qualquer outra definição.
Nem as comunidades imaginadas de Benedict Anderson, obra dedicada a definição das nações e das culturas, poderia conceber um Brasil tão diverso.

Se situamos Lima Barreto nesta dimensão, poderíamos dizer que ele fez de tudo para diferenciar-se, criando personagens a beira da morte e da vida. Utilizou recursos literários que foram criticados pelos os seus contemporâneos, mas finalmente tiveram que reconhecer sua genialidade. Uma genialidade que transpassa a linha imaginária do poder, tocando no ser humano e no seu universo diário.

Os escritos de Lima Barreto assumiram uma postura ideológica-político-social que o diferenciará de seus contemporâneos. Criando uma linguagem particular e provocando o tédio daqueles puristas que não vêem a linguagem como uma invenção social.

Para escrever Lima Barreto não obedeceu parâmetros, escreveu sem métrica e não teve nenhum pudor em utilizar a linguagem coloquial nas suas obras. Quem sabe a isso ele chamou liberdade. Simbolizá-la na sua obra significou encontrar no reino da imaginação a felicidade buscada.

Conclusão:

A idéia desse trabalho foi refletir sobre a vida de Lima Barreto e o seu importante legado nas letras brasileiras. Mais que um amontoado de adjetivos ou teorias literárias, o nosso objetivo foi mostrar um jogo de contradições internas de um ser humano pertubado, parido em um país também pertubado, que em um percurso pôde captar a vida de uma parte importante do nosso povo.

Sem dúvida conhecer a profundidade de sua obra é tarefa díficil, mas sentir a emoção de suas palavras nos serviu não somente para dimensionar sua importância nas letras, mas para descobrir um homem lutador e sensível que absorvendo, e compreendendo a dor de ser rejeitado foi capaz de ilustrar nas páginas da literatura brasileira uma amarga óptica social.

As sensações e reflexões do texto só tiveram a intenção de constituir um aporte a uma discussão que segue vigente no bojo da sociedade brasileira. Acreditamos que Lima Barreto sempre aportará elementos reais nesse sonho inacabado da construção da nação. Consideramos que os objetos desse imaginário social se define como movimento de lutas internas e externas permanentes que compõem a psíque e a alma de um povo.

Falar de imaginário social brasileiro talvez tenha sido uma pretensão, mas temos a certeza de que esta entidade interdisciplinária da chamada “imaginação” , aporta e seguirá aportando na criação dos projetos nacionais. Lima Barreto é profundo, é crítico, é especificamente sincero, e nessa sinceridade construimos as utópias.
Verdades ou particularidades,o importante foi passear por este universo de dor, e de incompreensão, terminando com a certeza de que os graves desequilíbrios sociais que sofre o Brasil algum dia em algum lugar serão frutos do passado.

Notas

(1) Castoriadis, La institución Imaginaria de la sociedad Vol.2 El Imaginario Social y la Institución, p. 11.
(2) Castoriadis, La institución Imaginaria de la sociedad Vol.2 El Imaginario Social y la Institución, p. 11.
(3) Idem.

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* Socióloga.
eugeniadossantos@gmail.com

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