Inventores do Além
Tom Coelho*
Seu monitor de LCD widescreen com 19 polegadas já foi uma tela plana de 15 polegadas que sucedeu grandes e pesados monitores com visor em fósforo verde. E sua multifuncional, quase em desuso, já deixou sem emprego o fax, que mandou para a aposentadoria o telex.
Projetar um avião não é nada. Construir um é alguma coisa. Fazê-lo voar é tudo.
(Otto Lilienthal)
Numa palestra sobre empreendedorismo um senhor na platéia ergue o braço e pergunta ao conferencista:
–Tenho um invento fantástico! Como consigo financiamento para produzi-lo?
–Qual é o produto? – pergunta o palestrante.
– Não posso contar. É segredo…
Resignado, o palestrante responde:
–Você pode procurar uma empresa de venture capital e apresentar seu projeto. Se for convincente, pode conseguir que invistam em sua empresa.
– Ah, mas que garantia tenho de que não roubarão minha idéia?
Você acaba de conhecer uma categoria singular de empreendedores. Eles não têm aparência de Professor Pardal, como nosso imaginário costuma postular, mas a presunção de que suas idéias são originais, seus inventos são exclusivos, e seus projetos serão capazes de mudar o mundo e o curso da história. Entretanto, como não dispõem de capital próprio para tocar adiante, buscam desordenadamente investidores – ou incautos – acreditando ser possível persuadi-los sem ao menos dizer do que se trata.
Vamos por partes. É preciso inicialmente compreender a diferença entre invenção e inovação. No primeiro caso, estamos diante de algo inédito, inusitado, seja um produto, um serviço ou um processo, decorrente de uma constatação, de mera observação ou empirismo, concebido com uma finalidade útil e percebido como tal. Já a inovação está associada à evolução de algo existente, que pode ser feito de maneira melhor, mais rápida ou mais barata.
Dentro deste contexto, é coerente notarmos que as inovações são muito mais freqüentes que as invenções, embora não menos importantes. E que inovações sucessivas podem conduzir a tal grau de desenvolvimento que, no limite, o paradigma vigente seja rompido dando espaço a um novo paradigma – e a uma possível invenção.
Olhe ao seu redor neste instante. Talvez você esteja diante de um teclado ergonômico sem fio, que sucedeu um teclado convencional com fio, cujo bisavô foi uma máquina de escrever – e cujos bisnetos serão um teclado virtual projetado sobre sua mesa ou um eficiente comando de voz.
Seu monitor de LCD widescreen com 19 polegadas já foi uma tela plana de 15 polegadas que sucedeu grandes e pesados monitores com visor em fósforo verde. E sua multifuncional, quase em desuso, já deixou sem emprego o fax que mandou para a aposentadoria o telex.
Diante destas e tantas outras evidências há momentos em que chegamos a pensar que tudo já foi inventado. Este era o pensamento de Charles Duell, diretor do Departamento de Patentes dos Estados Unidos, em 1899, ao propor o fechamento da sessão de registro de novas patentes. Contudo, produtos são lançados todos os dias desafiando esta tese. Ora muda a capacidade de armazenamento, ora as funcionalidades, ora o design. E você pode participar deste admirável mundo novo, desde que se conscientize de algumas prerrogativas básicas.
1. Pesquise sobre sua idéia. Antes de acreditar piamente que está diante de algo incrível, consulte o “Deus Google”, e não apenas ele, no seu e em outros idiomas, para se certificar de que não haja nenhum similar.
2. Passe pela peneira do mercado. Supondo que você transpôs a etapa anterior é hora de saber se existe viabilidade comercial para seu invento. Para tanto, você terá que levar sua proposta ao mercado. E não adianta restringir-se aos amigos mais próximos e familiares. Sua mãe certamente achará a idéia maravilhosa, pois ela sempre soube que o filho era um gênio. Mas a prova de fogo passa por um bom coach ou um mentor – um empresário ou professor em quem você confie, por exemplo – e o consumidor final.
3. Analise a viabilidade econômica. Há pouco você pode ter descoberto a viabilidade comercial de seu futuro negócio, ou seja, se produzido, haverá demanda. Porém, é preciso investigar se há viabilidade econômica, isto é, se o custo de produção permite uma oferta constante e a preços competitivos. Lembre-se de que o mundo não tem mais fronteiras e que há países com vantagens comparativas decorrentes de legislação, acesso a crédito barato e abundante e menores custos com mão-de-obra e carga tributária.
4. Registre e/ou patenteie. Contrate uma empresa idônea para a tarefa jurídica de proteger seu invento no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial). Trata-se de uma autarquia séria, porém carente de estrutura, onde os processos demoram a ser julgados. Portanto, quanto antes você fizer isso, melhor. Ademais, se possível, faça o depósito do registro também no exterior. A verdade é que o desrespeito a direitos autorais e patentes em nosso país é crítico – vide o sucesso da pirataria.
Assim, esteja preparado para brigar constantemente na justiça para fazer valer seus direitos, sem qualquer garantia de indenização. Mas é preferível ter a patente a não tê-la. Afinal, você não quer ser o próximo Kane Kramer, o britânico que concebeu a primeira versão do iPod há três décadas e não ganhou um centavo com isso porque deixou de renovar sua patente por falta de dinheiro.
5. Prepare um Plano de Negócios. Este será seu instrumento para vender seu projeto a fundos de investimentos, empresas de capital de risco ou mesmo instituições financeiras. Todo mundo sabe que um plano de negócios é apenas um guia que vale mais pelo treino de pensar o empreendimento do que pelos seus números em si. Aliás, digo que os planos são grandes exercícios de chutometria: gastam o dobro do tempo, o triplo de recursos e alcançam metade dos resultados esperados. Mas é assim que o jogo é jogado.
Neste processo, o maior erro que você pode cometer é pensar como o personagem real do início do texto com seu medo de falar sobre a idéia ou invento. Vai levar o projeto para o cemitério e ser enterrado com ele – um inventor do além-túmulo. Jamais verá o avião construído e nunca terá o privilégio da sensação suprema de voar.
* Tom Coelho, com formação em Publicidade pela ESPM , Economia pela USP, especialização em Marketing pela Madia Marketing School e Qualidade de Vida no Trabalho pela USP, e mestrando em Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente pelo Senac, é consultor, professor universitário, escritor e palestrante. Diretor da Lyrix Desenvolvimento Humano, Diretor Estadual do NJE/Ciesp e VP de Negócios da AAPSA. www.tomcoelho.com.br.