Brasil: Marina e a mística da mudança
1. As consequências definitivas da candidatura Marina ainda estão por ser avaliadas,
apenas decante a “poeira nuclear”. Ela chacoalhou uma realidade que até o dia 13 de
agosto tinha contornos claros de reeleição da Dilma no primeiro turno.
2. Na estreia da candidatura, vestiu o figurino feito sob medida – se desempenhou bem
no debate da BAND e na entrevista no Jornal Nacional, mostrando força e firmeza para
desfazer a imagem frágil e tíbia.
3. Com uma retórica positivista, promete a harmonia social em lugar do suposto cansaço
com a polarização PT/PSDB. Se autoproclama a expressão da “nova política”; surfa
com a conveniente identificação como “anti-política”, “anti-sistema”.
4. Marina carrega componentes místicos e messiânicos. Não só a trajetória de vida,
como a circunstância que a fez candidata, reforçam a imagem de predestinada. O
místico e o messiânico, em certa medida, imunizam-na contra a confrontação racional.
5. Ela se entregou ao poder econômico para garantir financiamento da campanha e,
principalmente, para conquistar a confiança do mercado como a candidata mais capaz
que Aécio de encerrar o ciclo de governos do PT. Para isso, reiterou as alianças, os
acordos e compromissos conservadores firmados pelo Eduardo Campos.
6. E entregou a chave do paraíso para os donos das finanças e do poder: a herdeira do
Itaú foi porta-voz da independência do Banco Central.
7. As promessas de campanha são filtradas, desditas, corrigidas e negadas segundo
critérios menos de coerência do que de conveniência eleitoral. O programa de governo é
uma enciclopédia de erratas e corrigendas: ela agora é a favor de tudo o que antes foi
contra; é contra coisas que era a favor e, em caso de dúvidas, ela é mais ou menos – não
é nem contra nem a favor, muito ao contrário …
8. Os altos índices nas pesquisas são [i] a soma do capital cativo – fez 19% em 2010 –
com [ii] as intenções de votos guiadas por fatores subjetivos. A comoção com a morte
do Eduardo Campos não é, nem de longe, o motivo para tal desempenho; mas, antes
disso, a narrativa midiática anunciando a candidatura dela num jogo cênico com
centenas de horas de cobertura televisiva e um bordão-síntese sedutor: “não vamos
desistir do Brasil” [sic]!
9. Marina é a principal tributária do sentimento difuso e contraditório de junho de 2013,
de mal-estar com a política, os políticos, os governos, as instituições, o sistema, e
“contra tudo o que está aí”.
Aqui se abre um parêntesis: apesar do enorme esforço de interpretação sociológico e
político sobre aqueles eventos, ainda pairam muitas dúvidas sobre a gênese, significado,
composição social, agendas e interesses implicados.